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quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

MODERNISMO E MODERNIDADE

O mundo moderno é uma experiência espaço-temporal movida pelo pensamento do desenvolvimento, da transformação, da dinamicidade, da busca incessante por novos desafios e conquistas, que rompe barreiras e atinge todo o mundo, provocando uma rede de relações cada vez mais complexas, passageiras e fragmentadas.

A modernidade, desse modo, produziu sociedades que possuem como característica comum a “mudança constante, rápida e permanente”, sendo esta a principal diferenciação entre “as sociedades “tradicionais” e as “modernas” (HALL, 2005, p.14). Por isso mesmo é que Berman (2000, p.22) diz que temos “um mundo onde tudo está impregnado de seu contrário”, um mundo onde “tudo o que é sólido desmancha no ar”. Em outras palavras, tudo está em permanente transformação e nada se completa, estabiliza ou se “ossifica”, pelo contrário, tudo é efêmero, não-fixo e instável.

Diante desse quadro, as relações entre Modernismo e modernidade se tornam ainda mais próximas, tendo em vista que o primeiro nasce das inquietações, das contradições e das exigências da última. E como o processo modernizador propunha uma filosofia revolucionária, de práticas sociais constantemente reformadas, que quebra os moldes comunitários tradicionais, muito se aproximou dos preceitos modernistas, adeptos dessa postura renovadora e conscientemente aberta para as novidades artísticas.

Percebe-se assim que o movimento histórico-literário-cultural das primeiras décadas do século XX era de mudança, de reinvenção de posturas e idéias, na tentativa de atualizar as formas de expressão artística e da inteligência nacional brasileira.

Entretanto, é necessário compreender que tanto a modernidade quanto o Modernismo possuem bases contraditórias, característica peculiar do mundo moderno, que se promove e se constitui a partir de choques irremissíveis entre estabilidade social e mudança dos modos de realizar a vida, entre práticas tradicionais e desenvolvimento acelerado, entre centro e margem, entre homem e máquina.

Todo esse conflito nos mostra que o ser humano, diante de sua capacidade criadora e criativa, torna a vida a cada instante mais instável e incompreensível, na medida em que “tudo está impregnado do seu contrário”. Se por um lado promovemos o avanço científico, por outro enfraquecemos os laços humanos entre as pessoas; se desenvolvemos a indústria, geramos, por conseguinte, e de maneira paradoxal, pessoas cada vez mais egocêntricas, perturbadas e destrutivas; se fabricamos máquinas avançadas, também fecundamos desemprego, angústia e exclusão, entre tantas outras proposições antagônicas.

A partir dessa perspectiva, o Modernismo brasileiro também se nutre dessas contradições, tanto para desarticular outras instâncias artísticas, quanto para montar suas próprias concepções sócio-ideológico-literárias. Só assim, poderia vir a se tornar um movimento literário de fato, negando ou opondo-se a preceitos e estilos estabelecidos.

A tradição foi violentamente questionada pelo modernismo, demolida naquilo que havia de perene, estável, anacrônico e que servia aos gostos exclusivos da “belle époque”, isto é, da elite brasileira, negando nesses termos, “a vinculação do presente com o passado histórico” (CARVALHAL, 1986, p.74). Entretanto, segundo Nascimento (2007) o Modernismo conseguiu, a muito custo, impor a sua própria academicidade e tradicionalismo, conseguindo assim, um status quo, uma posição assegurada no cenário histórico-literário.

De outro modo, o pensamento modernista se torna aparentemente paradoxal por se valer das idéias vanguardistas européias para, a partir dessas concepções estrangeiras, compreender e proclamar os temas e valores brasileiros.

Entende-se assim que os modernistas tentaram pintar as cores da nação brasileira com base em ideologias revolucionárias advindas da Europa, como o Futurismo, o Dadaísmo, por exemplo, porém não veio a descaracterizar a idéia de brasilidade, pelo contrário, pois “as raízes internas do Modernismo se configuram mais importantes do que as teorias importadas” (CASTELLO, 1999, p.67).

É nesse ambiente contraditório e instável, característico da modernidade, que o Modernismo brasileiro vai se desenrolar. Numa época marcada, sem dúvida, por uma espécie de dualismo constante, onde o bem e o mal caminham lado a lado, onde o capitalismo, o “progresso” técnico-científico só gera, inversamente, mais desigualdades sociais, as quais muitos artistas modernos procuraram evidenciar e “combater”.

O ser moderno se tornou, ao mesmo tempo, mais imprevisível e eficaz, criador e materialista, empreendedor e destrutivo, sonhador e egoísta, coletivo; graças aos ideais globalizantes, se tornou, na mesma medida, mais encurralado ao seu próprio ‘eu’ tumultuado, confuso, amedrontado, egocêntrico e vaidoso. Assim, são processos opostos que tornam o ser humano altamente projetado para a idéia de transformação dos meios materiais de produção moderna, tornando-o ainda mais criativo e dinâmico, porém, perigoso, instável, desumano e distorcido. E como a “modernidade significa aumento de eficácia” (ROUANET, 2006, p.103), ou seja, maior produtividade, lucratividade e racionalização, os modernistas, através da arte literária e de outras formas de expressão, tentaram também promover a re-humanização do homem. Não é a toa que Drummond (1940), no poema “Mãos dadas”, dizia: “O presente é tão grande, não nos afastemos. / Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas”. Com base no exposto, é compreendermos que a vida moderna se constitui dessa constante relação dúbia e conflitante entre o bem e o mal, entre o ser e o ter, entre a vida e a morte. Para uma época extremamente contraditória, as verdades absolutas e as posições extremadas perdem a noção de existir, e é por isso que há uma necessidade cada vez maior de lidarmos com situações conflitantes e conturbadas, para, assim, tornar o nosso mundo um pouco melhor para se viver.

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